Como usar o drama para fazer marketing

Por Pedro Aguiar, do IFDBlog

William Bonner em frente à Boite KissNo filme Nos Bastidores da Notícia (Broadcast News), de 1987, o personagem Tom Grunick, vivido por William Hurt, é um âncora de telejornal narcisista e inescrupuloso que manipula o aspecto patético do noticiário para ganhar audiência e, principalmente, prestígio profissional. Na sequência-chave da trama, ele edita um VT inserindo imagens de si mesmo chorando ao escutar o relato de uma entrevistada, vítima de estupro. Mas os métodos antiéticos e o jornalismo emocional e grotesco, na mesma medida em que o tornam queridinho dos chefes e executivos da emissora, rendem a ele a crítica e o desprezo entre os colegas.

O filme foi escrito e dirigido por James L. Brooks. No ano seguinte, Brooks seria criador, junto ao desenhista Matt Groening, do desenho animado Os Simpsons, uma das primeiras e mais contundentes sátiras à estereotípica família de classe média norte-americana, saída da Era Reagan com os valores exacerbadamente egocêntricos, materialistas e fúteis, preocupados tão somente com o lazer e o dia de amanhã, e com um desdém assumido por todo aprofundamento, toda crítica, toda ponderação.

O pai da família-escárnio concebida por Brooks e Groening, Homer Simpson, é uma figura simplória, trabalhador honesto porém disposto a pequenas mentiras e jeitinhos para satisfazer vontades ou resolver problemas. Desligado de questões que vão além de seu próprio jardim, tudo que Homer almeja em cada episódio é manter-se confortável em sua rotina, sem questionar o mundo, e refestelar-se no sofá após cada dia de trabalho para assistir a televisão.

Informação em redes

Foi esse arquétipo que o editor-chefe e apresentador do Jornal Nacional, William Bonner, elegeu para descrever o espectador médio de seu telejornal, o de maior audiência no Brasil há décadas. Não apenas na frente de professores como Laurindo Leal Filho, da USP, que chamou atenção para o aspecto desdenhoso da comparação anos atrás, mas também para estudantes de jornalismo levados a visitar a redação do JN – como eu, em novembro de 2005, então aluno da UFRJ . Hoje, passados alguns anos de formação e reprodução, o estilo Bonner/Homer (ou talvez Bonner/Grunick) parece ter feito escola e já está normalizado, em certos círculos tratados como se fosse “a” maneira de se fazer jornalismo.

Não fosse assim, não haveria espaço moral nem tolerância para a edição do Jornal Nacional de segunda-feira (28/1), gastar preciosos minutos com autopromoção em lugar de entrar direto com informações sobre a tragédia da boate Kiss em Santa Maria (RS). Deixando o lide para segundo plano, o âncora William Bonner preferiu descrever e apresentar ele próprio, a própria equipe, seu deslocamento, suas habilidades e suas reações subjetivas ao deparar-se com o fato, e não o fato em si.

Um take de Bonner dentro do jatinho particular apelidado de “JN no Ar”, para fins de marketing, tem carga informativa nula sobre os 245 mortos no incêndio da boate Kiss, bem como a situação de seus familiares ou a investigação sobre as causas e os responsáveis. Saber que a equipe decolou do Rio de Janeiro ou foi deslocada de São Paulo, Porto Alegre ou Buenos Aires para fazer a “suíte” da tragédia acrescenta absolutamente nada para quem está ansioso por notícia, nomes, números, histórias sobre o que ocorreu.

Este é apenas o trabalho dos jornalistas; não há nada ali para jactar-se. Não são “bastidores da notícia” – neste caso, reveladores de nada. Desperdiçar tempo de sinal ao vivo para promover seu próprio dever de ofício em vez de exercê-lo (ou seja, informar) é pegar carona na tragédia alheia para fazer marketing institucional. Além de narcisismo típico de amadores, demonstra insensibilidade e desrespeito para com a memória das vítimas, suas famílias e a população brasileira.

Uma nação que ficou consternada e solidária com a tragédia da Kiss não está esperando propaganda travestida de noticiário; tampouco está preocupada com avaliações passionais por parte de quem nem está autorizado a fazê-las. O fato é trágico em si: dispensa adjetivos e melodrama. A maneira mais respeitosa, mais honesta e mais jornalística de apresentá-lo é apenas com o objeto da notícia: as pessoas que morreram, as que enterraram seus mortos, as que estão chorando, as que estão buscando fazer justiça, e mesmo as que causaram tudo.

O horror fala sozinho, sem cenários, maquiagem nem trilha sonora. A narrativa melodramática tem seu lugar no imaginário social, mas é na novela, e não no programa que vem logo antes.

É mais sintomático que tal opção editorial pela tabloidização parta especificamente da TV Globo, que investe montantes vultosos em construção de imagem institucional, justamente porque esta é arranhada em seus pecados cotidianos, suas escolhas editoriais enviesadas e sua desfaçatez em manipular fatos e apresentá-los como isentos. De pouco ou nada adianta tanto marketing se, nos outros dias do ano, o produto principal da casa continua indo na contramão dos interesses públicos, o que é cada vez mais neutralizado pelos fluxos de informação em redes. Felizmente, os âncoras (que acumulam o cargo de apresentadores e editores dos telejornais de alcance nacional) não têm mais a força que tinham quando as emissoras brasileiras dos anos 1970-80 copiaram o modelo norte-americano dos anos 1950-60.

O que está em pauta

Se, no filme de 1987, James L. Brooks chamava a atenção para o “poder exagerado dos âncoras” e os responsabilizava (na voz do personagem Aaron Altman, o editor de texto que lhe servia de alterego) por “baixar os padrões, pouco a pouco” da sociedade, no desenho animado que está no ar até hoje ele demonstra os efeitos que esse processo midiático causa em uma família mediana. O pai da família Simpson, como o espectador idealizado do Jornal Nacional, comove-se com uma catástrofe agora, depois muda de canal e abre uma lata de cerveja no sofá para ver futebol. É contando com essa indiferença que a mídia corporativa opera. Por isso, cada vez se constrange menos em usar o espaço do noticiário para fazer seu próprio comercial.

Em outro VT, a inserção da imagem da correspondente Délis Ortiz acolhendo no ombro o choro da mãe de uma vítima do incêndio da boate República Cro-Magnon, ocorrido em dezembro de 2004, em Buenos Aires, é idêntica à artimanha de Tom Grunick no filme Nos Bastidores da Notícia. Coloca-se em primeiro plano o mensageiro, não a mensagem, e com isso joga-se para escanteio a dor, o sofrimento e o que verdadeiramente importa para o jornalismo, que é a informação.

Não que a repórter não tenha direito a se emocionar ou que o gesto de empatia não seja belo; claro que é. Apenas não tem lugar num jornalismo que abdique do aspecto patético e se concentre no objeto, como costumava se ensinar antes da Escola Bonner/Hommer. Jornalistas somos seres humanos, sem dúvida, mas não é nossa subjetividade que está em pauta. Ou, como ironizava Aaron Altman, “lembrem-se sempre: nós é que somos a notícia, não eles”.

_

Veja também no Caderno ENSAiOS:

As novas aventuras do Barão de Cisneros

“Na América Latina, monopólios midiáticos substituem partidos de direita” / Entrevista com Atilio Baron

“O jornalismo está defasado” / Entrevista com Eugênio Trivinho

“A indústria cultural nunca será inteligente” / Entrevista com Silviano Santiago

Homer e a casca de noz

“Na América Latina, monopólios midiáticos substituem partidos de direita” / Entrevista com Atilio Boron

Por Fernando Arellano Ortiz, no CronicÓn, via Brasil de Fato / Tradução: Adital

“Não há erro: os meios de comunicação simplesmente são grandes conglomerados empresariais que têm interesses econômicos e políticos. Na América Latina, os monopólios midiáticos têm um poder fenomenal que vêm cumprindo na função de substituir os partidos políticos de direita que caíram em descrédito e que não têm capacidade de chamar a atenção nem a vontade dos setores conservadores da sociedade”. Assim o politólogo e cientista social argentino Atilio Boron caracteriza a denominada canalha midiática.

Nesse sentido, explica, “cumpre-se o que muito bem profetizou Gramsci há quase um século, quando disse que diante da ausência de organizações da direita política, os meios de comunicação, os grandes diários, assumem a representação de seus interesses; e isso está acontecendo na América Latina”. Em praticamente todos os países da região, os conglomerados midiáticos converteram-se em “operadores políticos”.

A Crise do Capitalismo e o triunfo de Chávez

Boron, que dispensa apresentação por ser um importante referente da teoria política e das ciências sociais em Iberoamérica, foi um dos expositores principais do VI Encontro Internacional de Economia Política e Direitos Humanos, organizado pela Universidad Popular Madres de la Plaza de Mayo, que aconteceu em Buenos Aires, entre os dias 4 e 6 de outubro.

Tópicos como a crise estrutural do capitalismo, o fenômeno da manipulação dos monopólios midiáticos e o que significa para a América Latina o triunfo de Hugo Chávez foram tratados com profundidade por esse destacado politólogo, sociólogo e investigador social, doutorado em Ciências políticas pela Universidade de Harvard e, atualmente, diretor do Programa Latino-americano de Educação a Distância em Ciências Sociais do Centro Cultural da Cooperação Floreal Gorini, na capital argentina.

Para aprofundar sobre alguns desses temas, o Observatorio Sociopolítico Latinoamericano (www.cronico.net) teve a oportunidade de entrevistá-lo no final de sua participação em dito fórum acadêmico internacional.

Rumo a um projeto pós-capitalista

No desenvolvimento de sua exposição no encontro da Universidad Popular de Madres de la Plaza de Mayo, Boron analisou o contexto da crise capitalista.

“Hoje em dia é impossível referir-se à crise e à saída da mesma sem falar do petróleo, da água e das questões meio ambientais. Essa é uma crise estrutural e não produto de uma má administração dos bancos das hipotecas subprime”.

Recordou que, recentemente, foram apresentadas propostas por parte dos Prêmios Nobel de Economia para tornar mais suave a débâcle capitalista. Uma, a esboçada por Paul Krugman, que propõe revitalizar o gasto público. O problema é que os Estados Unidos estão quebrados e o nível de endividamento das famílias nos Estados Unidos equivale a 150% dos ingressos anuais. “Krugman propõe dar crédito ao Estado para que estimule a economia. Porém, os Estados Unidos não têm dinheiro porque decidiram salvar os bancos”.

A outra proposta é de Amartya Sem, que analisa a situação do capitalismo como uma crise de confiança e é muito difícil restabelecê-la entre os poupadores e os banqueiros devido aos antecedentes desses últimos. Por isso, essas não deixam de ser “pseudo explicações que não levam à questão de fundo. Não explicam porque caem os índices do PIB e sobem as bolsas. Ambos índices estariam desvinculados e as bolsas crescem porque os governos injetaram moeda ao sistema financeiro”.

A crise capitalista serviu para acumular riqueza em poucas mãos, uma vez que “o que os democratas capitalistas fizeram no mundo desenvolvido foi salvar os banqueiros, não os endividados, ou seja, as vítimas”.

Exemplificou com as seguintes cifras: enquanto o ingresso médio de uma família nos Estados Unidos é de 50.000 dólares ao ano, o daqueles de origem latina é de 37.000 e o de uma família negra é de 32.000, o diretor executivo do Bank of America, resgatado, cobrou um salário de 29 milhões de dólares.

Então, é evidente que cada vez mais há uma tendência mais regressiva de acumular riqueza em poucas mãos. Em trinta anos, o ingresso dos assalariados foi incrementado em 18% e o dos mais ricos cresceu 238%.

“No capitalismo desenvolvido houve uma mutação e os governos democráticos transformaram-se em plutocracias, governos ricos”. Porém, além disso, “o capitalismo se baseia na apropriação seletiva dos recursos”.

Por isso, citando o economista egípcio Samir Amin, Boron afirma sem medo que “não há saída dentro do capitalismo”.

Como alternativa, Boron sustenta que “hoje, pode-se pensar em um salto para o modelo pós-capitalista. Há algo que pode ser feito até que apareçam os sujeitos sociais que darão o ‘tiro de misericórdia’ no capitalismo. O que se pode fazer é desmercantilizar tudo o que o capitalismo mercantilizou: a saúde, a economia, a educação. Assim, estaremos em condições de ver o amanhecer de um mundo mais justo e mais humano”.

A reeleição na Venezuela

Sobre a matriz de opinião que os monopólios midiáticos da direita têm tentado impor no sentido de que a reeleição do presidente Chávez é um sintoma de que ele quer se perpetuar no poder, a análise de Boron foi contundente:

“Há um grau de hipocrisia enorme nesse tema, porque os mesmos que se preocupam com o fato de Chávez estar por 20 anos no governo, aplaudiam fervorosamente a Helmut Kohl, que permaneceu no poder por 18 anos, na Alemanha; ou Felipe González, por 14 anos, na Espanha; ou Margaret Thatcher, por 12 anos, na Inglaterra”.

“Há um argumento racista que diz que somos uma raça de corruptos e imbecis; que não podemos deixar que as pessoas mantenham-se muito tempo no poder; ou há uma conveniência política, que é o que acontece ao tentarem limar as perspectivas de poder de líderes políticos que não são de seu agrado. Agora, se Chávez instaurasse uma dinastia onde seu filho e seu neto herdassem o poder, eu estaria em desacordo. Porém, o que Chávez faz é dizer ao povo que eleja; e, em âmbito nacional, por um período de 13 anos, convocou o povo venezuelano para 15 eleições, das quais ganhou 14 e perdeu uma por menos de um ponto; e, rapidamente, reconheceu sua derrota. Então, não está dito em nenhum lugar sério da teoria democrática que tem que haver alternância de lideranças, na medida que essa liderança seja ratificada em eleições limpas e pela soberania popular”.

Confira a entrevista:

A canalha midiática assume a representação de interesses da direita

Hoje, no debate da teoria política, fala-se de “pós-democracia”, para significar o esgotamento dos partidos políticos, a irrupção dos movimentos sociais e a incidência dos meios de comunicação na opinião pública. Que alcance você dá a esse novo conceito?

Eu analiso como uma expressão da capitulação do pensamento burguês que, em uma determinada fase do desenvolvimento histórico do capitalismo, fundamentalmente a partir do final da I Guerra Mundial, apropriou-se de uma bandeira – que era a da democracia – e a assumiu. De alguma maneira, alguns setores da esquerda consentiram nisso. Por quê? Bom, porque estávamos um pouco na defensiva e, além disso, o capitalismo havia feito uma série de mudanças muito importantes. Por isso, a ideia de democracia ficou como se fosse uma ideia própria da tradição liberal burguesa, apesar de que nunca houve um pensador dessa corrente política que fizesse uma apologia do regime democrático. Estudavam sobre isso, possivelmente, a partir de Thorbecke ou de John Stuart Mill; porém, nunca propunham um regime democrático; isso vem da tradição socialista e marxista. No entanto, apropriaram-se dessa ideia; passaram todo o século XX atualizando-a. Agora, dadas as novas contradições do capitalismo e ao fato de que as grandes empresas assumiram a concepção democrática, a corromperam e a desvirtuaram até o ponto de torná-la irreconhecível, perceberam que não tem sentido continuar falando de democracia. Então, utilizam o discurso resignado que diz que o melhor da vida democrática já passou; um pouco a análise de Colin Crouch: o que resta agora é o aborrecimento, a resignação, o domínio a cargo das grandes transnacionais; os mercados sequestraram a democracia e, portanto, temos que nos acostumar a viver em um mundo pós-democrático. Nós, como socialistas, e, mais, como marxistas jamais podemos aceitar essa ideia. Creio que a democracia é a culminação de um projeto socialista, da socialização da riqueza, da cultura e do poder. Porém, para o pensamento burguês, a democracia é uma conveniência ocasional que durou uns 80 ou 90 anos; depois, decidiram livrar-se dela.

Mesmo em uma situação anômala mundial e levando-se em conta que a propriedade dos grandes meios de comunicação está concentrada em uns poucos monopólios do grande capital, como você analisa o fenômeno da canalha midiática na América Latina? Parece que, paulatinamente, vão perdendo a credibilidade…?

O que bem qualificas como canalha midiática tem um poder fenomenal, que vem substituindo os partidos políticos da direita que caíram no descrédito e que não têm capacidade de prender a atenção nem a vontade dos setores conservadores da sociedade. Nesse sentido, cumpre-se o que, Gramsci muito bem profetizou há quase um século, quando disse que diante da ausência de organizações da direita política, os meios de comunicação, os grandes diários, assumem a representação de seus interesses e isso está acontecendo na América Latina. Em alguns países, a direita conserva certa capacidade de expressão orgânica, creio que é o caso da Colômbia; porém, na Argentina, não, porque nesse país não existem dois partidos, como o Liberal e o Conservador colombianos; e o mesmo acontece no Uruguai e no Brasil. O caso colombiano revela a sobrevivência de organizações clássicas do século XIX da direita que se mantiveram incólumes ao longo de 150 anos. É parte do anacronismo da vida política colombiana que se expressa através de duas formações políticas decimonônicas [do século XIX], quando a sociedade colombiana está muito mais evoluída. É uma sociedade que tem uma capacidade de expressão através de diferentes organizações, mobilizações e iniciativas populares que não encontram eco no caráter absolutamente arcaico do sistema de partidos legais na Colômbia.

Com essa descrição que encaixa perfeitamente na realidade política colombiana, o que poderíamos falar, então, de seus meios de comunicação…

Os meios de comunicação naqueles países em que os partidos desapareceram ou debilitaram-se são o substituto funcional dos setores de direita.

O que significa para a América Latina o triunfo do presidente venezuelano Hugo Chávez?

Significa continuar em uma senda que se iniciou há 13 anos, um caminho que, progressivamente, ocasionado algumas derrotas muito significativas ao imperialismo norte-americano na região, entre elas, a mais importante, a derrota do projeto da Alca (Área de Livre Comércio das Américas), que era a atualização da Doutrina Monroe para o século XXI e isso foi varrido basicamente pela enorme capacidade de Chávez de formar uma coalizão com presidentes que, não sendo propriamente de esquerda, eram sensíveis a um projeto progressista, como poderia ser o caso de Lula, no Brasil e de Néstor Kirchner, na Argentina. Ou seja, de alguma maneira, Chávez foi o marechal de campo na batalha contra o imperialismo; é um homem que tem a visão geopolítica estratégica continental que ninguém mais tem na América do Sul. O outro que tem essa mesma visão é Fidel Castro; porém, ele já não é chefe de Estado, apesar de que eu sempre digo que o líder cubano é o grande estrategista da luta pela segunda e definitiva independência, enquanto que Hugo Chávez é o que leva as grandes ideias aos campos de batalha, e, com isso, avançamos muito. Inclusive, agora, com a entrada da Venezuela ao Mercosul, conseguiu-se criar uma espécie de blindagem contra tentativas de golpe de Estado. Caso a Venezuela permanecesse isolada, considerado um Estado paria, teria sido presa muito mais fácil da direita desse país e do império norte-americano. Agora, não será tão fácil.

Você vê algumas nuvens cinzentas no horizonte do processo revolucionário da Venezuela?

Creio que sim, porque a direita é muito poderosa na América Latina e tem capacidade de enganar as pessoas. E os grandes meios de comunicação têm a capacidade de manipular, enganar, deformar a opinião pública; vemos isso muito claramente na Colômbia. Boa parte dos colombianos compraram o bilhete da Segurança Democrática com uma ingenuidade, como aqui na Argentina compramos o bilhete de ganhar a Guerra das Malvinas. Portanto, temos que levar em consideração que, sim, existem nuvens no horizonte porque o imperialismo não ficará de braços cruzados e tentará fazer algo como, por exemplo, impulsionar uma tentativa de sublevação popular, tentar desestabilizar o governo de Chávez e derrubá-lo.

_

Veja também no Caderno ENSAiOS:

A “zona cinza” do conservadorismo

Verdade versus análise

“Precisamos democratizar o elitismo” / Entrevista com Sérgio Augusto

“A indústria cultural nunca será inteligente” / Entrevista com Silviano Santiago

“A indústria cultural nunca será inteligente” / Entrevista com Silviano Santiago

Por João Pombo Barile, do Suplemento Literário de Minas Gerais, edição especial “Reflexões sobre o jornalismo cultural”, via Observatório da Imprensa

Nascido em 1936, o mineiro Silviano Santiago é um dos mais refinados intelectuais brasileiros. Autor de diversos livros nos mais variados gêneros – poesia, romance, conto –, é na forma do ensaio que ele se tornou uma importante referência na vida cultural e acadêmica do país, ganhando ressonância até mesmo no exterior. Recebeu em 2010, pelo conjunto da obra, o Prêmio Governo de Minas Gerais de Literatura. Sua capacidade crítica, presente em livros como Nas malhas da letra (1989) e O Cosmopolitismo do Pobre: Crítica Literária e Crítica Cultural (2004), também pode serconferida nesta entrevista.

Quais as causas da desimportância atual dos rodapés literários no Brasil? A ideia da cultura como entretenimento tem ganhado mais e mais adeptos nas redações de jornal? O que resulta do embate do escritor com o computador? Qual a relação entre narrador pós-moderno e jornalista celebridade? Qual a importância de Jacques Derrida? A cada pergunta, Silviano responde com uma reflexão iluminada e iluminadora, mostrando ao leitor faces por vezes ocultas dessas questões.

Quando é que os rodapés literários pararam de ter importância no Brasil? É possível precisar uma data? E por que isto aconteceu?

Silviano Santiago –Tudo indica que podemos datar a perda de prestígio do rodapé. A partir da década de 1950, uma geração de críticos poderosos, formada pelas ideias modernistas, e os textos produzidos por eles e publicados em suplemento literário ou em revista, perdem gradativamente a importância nacional. Álvaro Lins serve de exemplo. Seu Jornal de crítica tem a primeira série de rodapés publicada em livro pela José Olympio no ano de 1941 e a sexta no ano de 1951. Saltam-se dez anos. A última e sétima coleção de rodapés escritos por ele e reunidos também em livro, volume ainda intitulado Jornal de crítica, sai então pelas Edições O Cruzeiro, no ano de 1963. O primeiro conjunto de textos, 1941, é dedicado a Paulo Bettencourt e ao jornal que ele dirige, Correio da Manhã. Lins agradece ao diretor e ao jornal por o volume de crônicas ter-se formado, “com a categoria de sua crítica literária oficial, numa colaboração de todas as semanas”. Havia, portanto, relação estreita entre coluna e jornal, entre coluna e linha editorial, entre colaboração e periodicidade. O sistema do rodapé era prestigioso, influente e orgânico. A relação está óbvia no próprio título das coleções de rodapés: jornal de crítica.

Outro exemplo, Brito Broca. Em prefácio a reunião de rodapés (ou de crônicas) de Brito Broca, datada de 1981, Antonio Candido esclarece: “Talvez os escritos de Brito Broca não satisfaçam aos que limitam a crítica à análise sistemática e altamente técnica dos textos”. Em leitura dos diários críticos de Sérgio Milliet, o mesmo Candido recomenda a vasta obra porque ela “pode ajudar muito a restaurar o que se poderia chamar o ato crítico, meio sufocado pelo aparato teórico contemporâneo. O ato crítico é a disposição de empenhar a personalidade, por meio da inteligência e da sensibilidade, através da interpretação das obras, vistas sobretudo como mensagem de homem a homem”.

Não é, pois, difícil detectar a causa para a perda de prestígio do rodapé. A apreciação de Candido, formado por professores brasileiros e franceses na USP, aponta, de um lado, para a ausência na produção jornalística de fundamento propiciado por conhecimento técnico (teórico?) da arte literária e, do outro lado, para a limitação no ato de julgamento pelos que rechaçam o jornal e são geradores de valores teóricos no processo de análise da arte. A atitude de Candido pode ser reforçada pelos escritos raivosos dos anos 1960 de Afrânio Coutinho, logo depois de um período de estudos nos Estados Unidos, em que se entregou à leitura do new criticism. Os escritos de Afrânio, contundentes pelo tom de desprezo pelos jornalistas culturais, foram reunidos no volume No hospital das letras (1963), onde é espezinhada a figura de Álvaro Lins e o gênero de trabalho crítico a que se dedica. Não passava de um mero crítico impressionista.

No bate-boca entre os colunistas de jornal, formados pelo saber modernista sobre as artes, e seus dois (então jovens) leitores, formados pela pós-graduação universitária, está o conflito que marca a passagem de uma postura impressionista à outra, dita técnica. Uma se sobrepõe à outra no correr da década de 1960 e a leva de vencida na década de 1970. O centro da apreciação crítica é deslocado do papel-jornal semanário para o ensaio ou a tese universitária, de circulação restrita e bem modesta. As famosas panelinhas literárias perdem o espaço buliçoso e alvissareiro dos bares e restaurantes do centro da cidade para ganhar a austeridade e a linguagem especializada do campus. Talvez haja ganho em qualidade crítica na tarefa; talvez o grande público perca o acesso às ideias abstratas expostas pelos rodapés. O crítico amador, cuja formação tinha sido feita no contato com os tratados sobre filosofia e estética e com os livros dos grandes autores de literatura, perde o prestígio e é substituído pelo especialista em literatura, que aprecia o romance e a poesia nos detalhes (close reading), a partir de rigorosos pressupostos metodológicos, tomados a uma das correntes críticas colocadas à disposição do estudioso nos bancos acadêmicos. O colunista “oficial” (a palavra é de Lins na dedicatória do livro ao Correio da Manhã e seu diretor) do suplemento literário é substituído pelo professor titular no Departamento de Letras, emérito autor de história da literatura brasileira e responsável pelos cursos de pós-graduação, onde os alunos, por sua vez, produzem trabalhos de estágio e teses de mestrado e de doutorado.

Da perspectiva da implantação do Modernismo no Brasil, outra maneira de ver o tema do rodapé seria o da análise do movimento por gêneros literários. Década de 20: dominância da poesia. Década de 30: dominância da prosa. Década de 40: dominância da crítica. O final do rodapé coincidiria com o final da forte e definitiva influência das ideias modernistas na formação do jovem escritor.

Nesse tipo de discussão, há uma terceira via que é sempre esquecida. Desde os anos 1920, na época da vanguarda modernista, os próprios artistas buscavam espaço no jornal e se faziam de críticos literários e de arautos da própria obra. É o caso de Mário de Andrade e de Manuel Bandeira, principalmente. Nos anos 1950, época em que o crítico de rodapé perde influência nacional e o crítico universitário não a alcança, é a nova vanguarda, hoje tida como “experimental”, que passa a ocupar os jornais e os suplementos. O caso mais notável é o do suplemento do Jornal do Brasil (SJDB, lançado em junho de 1956), tomado de assalto pelos neoconcretos, liderados por Mário Faustino. Os irmãos Campos e Décio Pignatari atuam de maneira semelhante em São Paulo (suplemento de O Estado de S. Paulo) e nos suplementos cariocas, tendo recebido destaque na famosa Revista do Livro, do INL, no momento em que Alexandre Eulálio era redator-chefe. Em Minas Gerais, há que citar o caso do pessoal da revista Tendência (Affonso Ávila, poeta, e Rui Mourão, romancista) e da revista Complemento. Lembre-se, ainda, que uma nova geração de escritores surgirá neste suplemento literário.

Três detalhes a serem explorados.

1.Há uma importante fusão das artes a partir da época do experimentalismo. Cinema, artes plásticas, teatro e balé cortejam a literatura. O livro Alguns, de Júlio Bressane, é revelador nessa matéria. Diz ele lá que as palavras do poema “Cidadezinha qualquer”, de Carlos Drummond, pintam um quadro de Tarsila: “Casas entre bananeiras / mulheres entre laranjeiras / pomar amor cantar”. Ao filmar Vertigo, Alfred Hitchcock escreve um poema de Mallarmé. Já Mário Reis, o Braguinha, desenha Betty Boop, criada por Max Fleischer, ao compor a marchinha “Moreninha da praia”. O filme Vidas Secas, de Nelson Pereira dos Santos, escreve o romance de igual nome assinado por Graciliano Ramos.

2.Há também um jornalismo cultural que pode ser lido de maneira enviesada e que, por isso, beira o gosto pela anedota. Refiro-me à correspondência trocada entre grandes escritores. De maneira retrospectiva, ali se pode ler a história subterrânea e amistosa dos vários caminhos por que passa, por exemplo, o modernismo no processo de afirmação. De certa forma, ler as cartas trocadas por Mário com seus amigos equivale à leitura atual do jornal de crítica, de Álvaro Lins, ou do diário crítico, de Sérgio Milliet.

3.No novo milênio, o jornalismo cultural é feito por profissionais formados nas Escolas de Comunicação (e não mais nas Faculdades de Letras). Está para ser analisado o estilo que os comunicólogos devem imprimir aos textos e à crítica. Já é certo que a ideia de cultura como entretenimento ganha mais e mais adeptos nas redações de jornal.

A indústria cultural brasileira, pelo menos aparentemente, foi mais inteligente do que a atual (fiquemos apenas em dois nomes: Chico Buarque e Caetano Veloso). Passados 27 anos do fim da ditadura, como você vê a produção cultural do país? É possível comparar os dois períodos? [Aqui penso, sobretudo, no seu texto “Democratização no Brasil: 1979-1981 (Cultura versus Artes)” e, se possível, gostaria que você fizesse uma pequena reavaliação do texto. O que ainda vale? O que não?]

S.S. –A indústria cultural brasileira, ou a estrangeira, nunca foi e nunca será inteligente. Ela pode ser favorecida pelos fados da radicalidade dos governos, contrários à inteligência e à cultura, e ganhar, por interposto agente – por exemplo, regimes totalitários ou regimes ditatoriais −, importância e respeito, perdendo o caráter óbvio de mero entretenimento. É claro que, depois desse empurrão inicial e no caso de os artistas conseguirem se renovar, a indústria cultural, modificada nos seus alicerces, lhes proporcionará anos de bonança e de riqueza. O artista que lá põe o pé e consegue permanecer firme, de lá nunca se arredará. Tentará encontrar palavras e argumentos que justifiquem a sua permanência.

Esse é um paradoxo difícil de ser esboçado em poucas linhas. Ele surge no Brasil e na América Latina nos anos 1960 e nos anos seguintes. Valho-me dos nomes que você cita. Chico Buarque resumiu a ambivalência na canção “Apesar de você”. Apesar dos militares no poder, a MPB funciona às mil maravilhas e tem uma plateia privilegiada e imensa. A canção anuncia a felicidade geral do povo brasileiro no dia de amanhã: “Apesar de você / Amanhã há de ser outro dia / Eu pergunto a você onde vai se esconder / Da enorme euforia? / Como vai proibir / Quando o galo insistir em cantar”. Caetano, por sua vez, resumiu-a no hit “Soy loco por ti América”: “El nombre del hombre muerto / Ya no se puede decirlo quien sabe / Antes que o dia arrebente… / El nombre del hombre es pueblo”.

Dadas as circunstâncias da ditadura militar no país, o artista alimenta e é alimentado por vasto público. A ele se dirige em termos menos artísticos e mais conteudísticos. Trata-se da estética do “bom conselho”, como a apelidei em Uma literatura nos trópicos. Quando se avulta a insatisfação popular, o artista vai canalizá-la e emprestar-lhe sentido em mensagem de tom otimista, que acaba por ser apreciada por um número maior do que o dos happy few que amam a arte. Simplificadamente enuncio o paradoxo: quando o Estado nacional passa por crise aguda e insustentável, olhos e ouvidos do povo abrem-se para a mensagem artística, seja ela pessimista (crítica) seja ela otimista (utópica). A obra torna o artista figura carismática. É ele que, enquanto intelectual (e não como artista, capaz de refletir sobre as insuficiências e os limites do próprio trabalho artístico), sustenta o próprio nome e a obra. Aliás, a mensagem do intelectual (muitas vezes engajado) nega a reflexão do artista sobre o trabalho de arte. Ela minimiza a este para ser mais direta e convincente, mais sedutora. No caso dos anos de chumbo no Brasil, as chamadas artes da imagem e da oralidade (cinema, música popular, teatro, etc.) foram as privilegiadas. O analfabetismo, ou o pouco interesse do brasileiro pela letra impressa, sempre passa a perna na expressão propriamente literária. Passa a perna no livro.

No novo milênio e no contexto do saber e da cultura, a discussão sobre o fim da ditadura torna-se menos importante que a avaliação da importância crescente da fibra ótica. Os anos de chumbo já se tornaram objeto institucional, haja vista a importância de se criar uma comissão da verdade. No novo milênio, os vários avanços tecnológicos propiciados pelo uso inteligente da fibra ótica tomam de assalto o lugar privilegiado ocupado por Gutenberg para lançar o livro impresso. A forma de estocagem do saber objetivo e da produção de arte muda, assim como mudam os meios científicos e artísticos de sua transmissão. Fiquemos com a cultura. Ela nasce hoje para ser rotulada ou como reflexões minimalistas sobre o umbigo, independente do meio que a veicula (veja o caso da poesia), ou já se apresenta a priori como mercadoria no mercado industrial (o caso do entretenimento puro e simples). Por industrial entenda-se – com a ajuda de Walter Benjamin – a exigência de um grande público que sustente financeiramente a obra e abra para o artista a possibilidade de novas criações. Os happy few não pagam o custo de uma mercadoria cultural.

Passo por cima do óbvio em indústria cultural (o cinema, a televisão, o vídeo, o CD etc.) e entro no campo literário. O embate do escritor hoje é com o computador, seja para torná-lo meio de comunicação entre pares (as várias linguagens do umbigo, expressas nas redes sociais), seja para domá-lo – com o respaldo do editor de livros – como lugar popular e barato de recepção do seu texto (os vários sistemas de leitura do e-book). Mesmo o texto jornalístico de caráter artístico sai simultaneamente no papel e na internet, veja o caso do jornalismo cultural. A folha de papel impressa não dispensa a sua reprodução na telinha. O embate do escritor de literatura pode ser também com o cinema, a televisão e o vídeo (ele será autor de scripts), ou com o CD (será autor de canções). Neste caso, sua produção textual perde o caráter de expressão artística de uma subjetividade (voltamos ao tema do umbigo) para se adequar ao esforço de uma coletividade de artistas (ou seja, ele tem de buscar uma trama que seja compatível com o desejo da maioria da equipe a ser montada e devidamente remunerada). A indústria cultural exige o entrosamento. Bem que os franceses tentaram criar o cinema de autor.

A passagem do umbigo para a mercadoria pode ser atestada pela crescente importância da figura do agente literário no diálogo da obra (indiretamente do autor) com as editoras. O autor não recebe mais o tapinha nas costas do editor, que lhe era dispensado quando entrava na José Olympio. Tampouco o editor lhe sussurra: passe no caixa para receber um vale com o adiantamento dos direitos. As relações se estabelecem por contrato assinado pelas partes.

O legítimo criador literário pode dispensar tudo, menos a folha de papel, mas isso se dá e continua a se dar por decisão individual e íntima. Há artistas que apostam, não no dia seguinte ao da ditadura (Chico Buarque e Caetano, citados por você), não no último meio artístico em pauta (os poetas experimentais e seus suportes técnicos), mas no dia seguinte ao da realização de toda uma obra. Costumo chamá-los hoje de escritores póstumos, e o melhor exemplo de vitória póstuma na atualidade brasileira é Clarice Lispector, como no dia de ontem foi Machado de Assis e, de certa forma, Oswald de Andrade. Ela confiou sem desconfiança nos textos que escreveu, confiou na arte literária em que acreditava. Foi profissional, sendo amadora. Em vida, teve um público minguado e morreu à míngua. Apenas dois dos seus inúmeros títulos ganharam edição que não fosse a primeira. Trata-se de uma aposta e, como tal, pode levar o jogador ao buraco do silêncio eterno ou ao céu do sucesso póstumo. A obra literária se assemelha ao cavalo no jogo de xadrez, que se move pelas diagonais. No tabuleiro da arte, a graça do seu movimento nada tem a ver com a linearidade do peão. Além do mais, se estiver na casa preta pode mover-se para a branca, e vice-versa.

Gostaria que você comentasse, a partir do seu conceito de narrador pós-moderno que está presente em “Nas malhas da letra”, o estranho fenômeno que acabou acontecendo nos últimos anos no jornalismo: o jornalista celebridade. A lista seria infindável (e só da Globo preencheria várias laudas). Mas voltando a fraca fria: a partir deste tipo de jornalista e pensando no seu texto do narrador pós-moderno. Hoje o jornalista é, muitas vezes, apresentado como mais importante que a notícia. Concorda?

S.S. –Política e indústria cultural têm uma exigência prioritária. Têm menos a ver com o produto pelo qual são responsáveis e mais a ver com o nome próprio que o assina. O próprio do produto e o próprio do nome são raramente discutidos e debatidos. Nome próprio é nome próprio, e vende. Políticos e atores (no sentido amplo das categorias) são figuras carismáticas. A etimologia latina da palavra carisma diz tudo. São pessoas que recebem um dom da natureza, que são favorecidos pela graça divina, e se contentam em dar asas ao dom e à graça recebidos. Não se questiona quem são eles e o que fazem, a não ser pelo viés da maledicência, que, aliás, infesta a imprensa marrom. Os paparazzi fotografam os nomes próprios.

Se não me engano foi Edgar Morin quem, na segunda metade do século 20, pôs primeiro o dedo numa nova categoria de seres humanos que estava sendo criada pelos meios de comunicação de massa – a estrela (Les stars, 1957). Seu livro foi traduzido ao português com o título de As estrelas: mito e sedução no cinema. (Glosando sua constatação sobre o jornalista, sabemos de há muito que a estrela é mais importante que o filme.) Tomado ainda pela linguagem psicanalítica, Morin percebia na base do mito um processo de projeção/identificação do espectador/leitor, que se expressava pelo desejo não satisfeito, reprimido (as calcinhas que as moçoilas ainda recentemente jogavam no palco em que Wando se apresentava é uma espécie de link libidinoso. Por cima da diferença entre palco e plateia, entre ator e espectador, no meio da multidão, estabelece-se um diálogo íntimo e intransferível do sujeito com o objeto do desejo). Em romance, De cócoras, tentei cena semelhante, valendo-me de Rita Hayworth no filme Gilda.

No entanto, por ser grande conhecedor do cinema, haja vista o clássico Le cinéma, ou l’homme imaginaire, Morin saiu pela porta da psicanálise e entrou pela janela da teoria sobre as artes do espetáculo. O processo de projeção/identificação do espectador com a estrela é usado pela indústria cultural – ele constatou − que passa a transformá-la em mercadoria cada vez mais rentável. A estrela vende tudo o que leva o nome que lhe é o próprio, seja o produto propriamente artístico, seja ainda o produto industrial tout court (refrigerante, perfume, automóvel etc.). Tudo é mercadoria, tudo é consumo no universo da estrela. Haja Rodrigo Santoro e Ivete Sangalo! De vez em quando, surge uma voz indignada, que apenas acentua o peso da lei geral. Caetano não quis que o nome Tropicália fosse dado a um edifício em construção.

No entanto, há que se fazer um esclarecimento. Se a criação da estrela pela indústria cultural é passível de discussão e de crítica, não há dúvida de que os novos meios tecnológicos de comunicação são responsáveis por novas formas de linguagem, por novos tipos de narrativa que afetam a tradicional “retórica da ficção”, para retomar a expressão de Wayne Booth. A linguagem cinematográfica veio para se espraiar para as outras linguagens artísticas.

O pós-moderno, no texto a que você se refere, publicado em Nas malhas da letra, era definido pelo fato de que o jornalista, enquanto narrador, tinha sido desprezado por Walter Benjamin como superficial, mas estava sendo valorizado por alguns escritores na época em que a linguagem geral (a língua franca, por assim dizer) do drama era tomada de empréstimo a ele e ao meio. Quem atua (no real) é sempre observado por um espectador que, por sua vez, passa a atuar como narrador (no campo da arte).

Minha hipótese de trabalho era ampla: o autor pós-moderno narra a ação enquanto espetáculo a que assiste (literalmente ou não) da plateia, da arquibancada ou de uma poltrona na sala de estar ou na biblioteca; ele não narra enquanto atuante, embora acabe por o ser. Tentava, então, deslocar o fulcro da narrativa da figura da estrela (o ator, o atuante) para a figura do espectador (o leitor, caso ele fosse crítico do ator e da ação por ele praticada – no caso de Wando, interessava-me mais quem jogava a calcinha do que o artista que levava o espectador a jogá-la). Anunciava o fim da narrativa narcisista, feita pela estrela na primeira pessoa do singular, apanágio da grande literatura europeia, e mal sabia que estava dando trela a outro tipo de narcisismo, o do espectador/leitor enquanto narrador. Devo ter caído nas malhas do meu ídolo Jorge Luis Borges. Ou nas malhas da minha prosa libertária intitulada Em liberdade. A prisão vivenciada pelo meu personagem, Graciliano Ramos, era expressa através da forma-prisão, o pastiche, de que se valia o narrador para relatar a experiência real do outro. A estética recobria a ação para dar nascimento a uma escrita ética.

Em termos mais gerais, a linguagem – seja ela a artística, ou não – é uma ferramenta. Uma ferramenta semelhante ao fogo, que nos foi doado por Prometeu. A técnica é que encaminha, de uma maneira ou de outra, o funcionamento das mãos em contato com as possibilidades do fogo e da linguagem.

Caso o leitor (no caso o espectador da cena a ser a narrada, ou seja, o narrador não-atuante, a moça que joga a calcinha para Wando, o jornalista) deixe de ser crítico (de ser ético) na própria narrativa, o problema é menos dele do que da própria crítica atuante no nosso momento histórico. Se o jornalista é mais importante que a notícia, para te glosar, há algo de podre no reino das comunicações e algo de mais podre na crítica dos espetáculos.

O aumento do número de vagas no ensino superior, com critérios populistas e não técnicos, tem causado grave problema para muitas universidades espalhadas pelo país. À boca pequena (nos bastidores) já se fala até na possibilidade do curso de Letras “caminhar” de mãos dadas com o jornalismo (espécie assim de “fusão camuflada”). O que pensa disto? E do futuro dos nossos cursos de Letras?

S.S. –O aumento de vagas em qualquer dos níveis de ensino é sempre algo de positivo. Portanto, não há que se queixar do avião como meio de transporte se ele, por decisão do governo norte-americano, despejou bombas atômicas no Japão. Há sempre que se questionar o modo como as coisas são feitas, principalmente as que na verdade deveriam ser bem feitas. A importância das medidas tomadas por Jules Ferry, ministro da educação na França ao final do século 19, atestam até hoje a favor da escola pública, leiga e republicana para todos os cidadãos, indiscriminadamente.

Nos países do Novo Mundo, em virtude de o processo de colonização ter sido feito de fora para dentro, em virtude de o processo ter sido de responsabilidade de europeus e ter comportado o extermínio da raça indígena e a escravidão africana, há injustiças históricas em relação aos descendentes dessas duas etnias. Não há dúvida de que, no tocante à educação e a outras obrigações públicas, há no Brasil grupos de cidadãos privilegiados e grupos de cidadãos não privilegiados. Como estabelecer a justiça? Como trabalhar com vistas à igualdade? Como neutralizar os preconceitos inerentes ao status quo? Essas e muitas outras questões deveriam ter sido feitas pelos homens públicos que – corretamente – procuram um sistema de compensação para beneficiar na área da educação todos os que, no correr dos séculos, foram destituídos dos seus direitos.

Guardadas as diferenças, a decisão desses homens públicos é semelhante à decisão tomada pelo presidente Truman no fatídico dia 3 de agosto. O fim da guerra com as forças do Eixo e a educação pública para todos e em todos os níveis são uma necessidade. Se essa necessidade leva o governante a mandar jogar uma bomba atômica (metafórica ou não) no já pobre e desmantelado ensino público brasileiro, é um gasto horroroso de energia, uma tragédia calamitosa e uma perda irreparável de tempo. Já vê que o que seja “técnico” e o que seja “populista” nessas matérias em que o problema fundamental é o da justiça ou da ética, e não o da mera política, é discussão por demais delicada para poucas linhas.

Problema bem distinto é o segundo proposto pela pergunta. Os já tradicionais cursos de Letras se aproximam dos novos e expansíveis cursos de Comunicação – e provavelmente se fundirão. É inegável que o avanço da tecnologia em fibra ótica na área de produção, estocagem e transmissão do saber retira o livro do pedestal onde foi colocado por séculos (a biblioteca) e é, ao mesmo tempo, algo que veio para ficar. Acima disse algumas palavras sobre isso. A questão da aproximação e fusão dos cursos tem duas pontas que deveriam ser analisadas.

Numa ponta, está uma questão propriamente orçamentária e na outra uma questão relativa à melhor e mais completa formação do aluno. Não é interessante que os cursos se dupliquem (ou seja, tenham gastos inutilmente duplicados), oferecendo conteúdos praticamente similares, nem é interessante que o aluno interessado pela questão da linguagem (artística ou não) no século 21 tenha uma formação limitada por ter optado por Letras (linguagem fonética, livro) ou, caso paralelo, por Comunicação (linguagem dos meios de comunicação de massa, mídia eletrônica).

É inegável que os cursos de Letras terão o futuro que o livro tiver. Qualquer cálculo no dia de hoje é precipitado, como o foi nos anos 1960, após a publicação do livro A galáxia de Gutenberg. A partir das ideias desenvolvidas por McLuhan os poetas concretos chegaram a “dar por encerrado o ciclo do verso” (v. Plano piloto da poesia concreta). O verso continuou firme e forte na produção dos poetas marginais e até nas (notáveis) traduções feitas pelos próprios irmãos Campos. De novo, estamos diante de matéria delicada para algumas linhas.

Nos cadernos de cultura de hoje cultura é sinônimo de entretenimento. O que pensa disto?

S.S. –Sinal dos tempos seria boa resposta, comprometida com o atual estágio mercadológico por que passa a cultura nas nações do Primeiro Mundo, que influenciam, por sua vez, todo o planeta. Veja-se uma única figura, Michael Jackson, e perceba-se a quantidade enorme de coisas que giram em torno dele internacionalmente. Da reprodução ao pastiche e à paródia. Vivemos mundialmente num regime único de arte, impossível de ser recuperado ou de ser transformado, a não ser pelo trabalho de jovens que são logo assimilados pelo regime único.

Às vezes me assusto com o fato de que há obras de arte, muitas vezes secundárias, que têm o dom de horóscopo. Prognosticam o futuro com a graça e a desenvoltura de quem entendeu para que veio, para que viemos e para onde vamos. Refiro-me, por exemplo, ao filme musical Em busca de um sonho (“Gipsy”), de 1962. (As músicas para a peça em que o filme se baseia foram escritas pelo mago Sondheim, em 1959.) O personagem da filha (Nathalie Wood) em confronto com a mãe (Rosalind Russell), uma estrela decadente e controladora, diz o que se deve dizer (metaforicamente) sobre as figuras que dominam a arte do entretenimento: “Me with no education. Me with no talent. Maman, look at me now. I am a star. Look how I live. Look at my friends…” e assim por diante. A canção, que se tornou famosa na voz de Nina Hagen ou Chita Rivera, complementa: “Let me entertain you / Let me make you smile / Let me do a few tricks / Some old and some new tricks / I’m very versatile”.

Depois dessa lição de palco, de strip-tease, de sorriso, de truques e de versatilidade não há como duvidar que a cultura passe a segundo plano. Entretenimento na cabeça.

Gostaria de uma pequena palavra sua sobre a importância que teve o trabalho que você é o principal responsável de ter tornado a obra de Derrida conhecida no Brasil. Gosta da recepção que ela tem hoje entre nós?

S.S. –Sem dúvida, Jacques Derrida é um dos grandes filósofos do século 20, e não um mero professor de filosofia. Sua obra escapa, pois, aos parâmetros de uma entrevista. Sua presença, no entanto, pode ser delineada através de uma questão capital, a meu ver, para o bom entendimento da importância da literatura a que chamei de póstuma. Não há dúvida de que, nos dias de hoje e em relação à produção literária classificada como moderna, a filosofia é a melhor articuladora de problemas e propicia melhores leituras que as ciências sociais. Nessa matéria, e há que se tirar o chapéu para o filósofo, ele trabalhou todos os grandes pensadores que o antecederam. Pense em Heidegger leitor de Hölderlin, pense em Benjamin leitor da reprodutibilidade técnica da arte, pense em Nietzsche e os helenos, pense em Bataille, Blanchot e Foucault, eles lá estão bem estudados. E tantos outros. A desconstrução é uma chave que abre todas as portas do saber humano pelo viés da história (da história da filosofia) e pelo viés da atualidade (da leitura a contrapelo). O leitor de Derrida está e estará diante de um arquivo infindável.

Daí a dificuldade em tomar assento na plateia de Derrida e em abrir a boca. Aliás, o próprio ato de proferir palavras oralmente tem pouco valor para ele (quem o conheceu pessoalmente sabe que ele nunca falava “de improviso”; suas aulas, palestras e conferências eram sempre “lidas”). De uma perspectiva populista e/ou demagógica, esse é o primeiro grande obstáculo que o leitor de Derrida tem de enfrentar. Enfrentar a linguagem como letra morta, ou seja, como letra que para poder existir enquanto tal teve de assassinar o pai (o locutor). O texto é como um filho assassino e bastardo, que caminha pelo mundo, de um lado para o outro, de uma época para a outra, à procura de quem possa lhe dar significado − o leitor.

Platão nos fez acreditar que a verdade seria expressa pelo locutor presente, junto à sua fala. Responsável por ela, ele seria sensível aos comentários do outro, ou seja, seria capaz de corrigir, ou de rasurar a própria fala no próprio momento em que se expressava. No entanto, é a verdade das ideias de Platão que está hoje impressa sob a forma de diálogo. O diálogo é apenas uma forma, uma forma fonocêntrica (defende a expressão oral) e etnocêntrica (defende a tradição ocidental) de saber, e não traduz a complexidade do processo de busca da verdade. Há que desconstruir o fonocentrismo que está na base do pensamento socrático, há que desconstruir o etnocentrismo que é fundamento do pensamento europeu. Descontruídos, chegamos à conclusão de que a verdade está sendo dada pela leitura de ocidentais e não-ocidentais, pela leitura do diálogo socrático, pela leitura do texto. Um lado do mar Mediterrâneo é europeu, mas o outro é africano.

É o próprio texto platônico, mostrou-nos Derrida em A farmácia de Platão, que se articula pelas ambivalências de sentido. Estas são apreendidas numa leitura cuidadosa dos rigorosos e frágeis esquemas linguísticos de que se serve o filósofo – e qualquer escritor para montar o texto que deverá nos levar ao conhecimento da verdade. Estamos sempre diante de diferenças. A diferença organiza o pensar, daí que Derrida desclassifique o tradicional conceito, para nos propor o pensamento a partir de palavras escritas, cujo sentido é indecidível (indécidable). O leitor, como figura, é um decisor, mas no seu texto de decisor, haverá também indecidíveis, que só serão apreendidos por outro e futuro decisor.

***

[João Pombo Barile é jornalista e diretor do SLMG]

Aldir, Vidal e o uivo barroco da solidão de Ouro Preto

Caderno ENSAiOS publica o belíssimo texto do Aldir Blanc, lido por José Wilker, durante a cerimônia do Prêmio da Música Brasileira.

Mas, antes do texto de um dos nossos poetas mais lúcidos, o blog traz um pequeno comentário sobre a reflexão do Aldir. E ele é assinado pelo grande Vidal Assis, músico de uma nova geração da canção carioca.

O Prêmio da Música Brasileira traz gratas surpresas, como Zé Renato brilhando em “Bodas de Prata”, Ney Matogrosso revivendo “O Cavaleiro e os Moinhos”, Alcione interpretando “Quando o Amor Acontece”, o dueto de Mônica Salmaso e Renato Braz em “Sinhá”, além de outras interpretações importantes.

Entretanto, contrariando toda a fantasia de glamour da noite, eis que, em certo momento, salta o lúcido texto de Aldir Blanc, interpretado por José Wilker. O texto fala não só da parceria Bosco & Blanc, mas também dos retratos que os frutos dessa parceria trouxeram para a música brasileira: a escravidão, a inquisição, a violência urbana, as lutas inglórias. E, ao terminar o texto, Aldir quebra o último castiçal da ilusão daquela noite, escrevendo sobre o entretenimento barato disfarçado de arte; sobre as pontas dos arietes da massificação escondidas pelo brilho das telas; sobre a cultura “facilitada”, feita para adocicar, iludir, marginalizar, manter as relações de poder cristalizadas em nossa sociedade, vender e lucrar. E face a essa proposta de cultura, a resposta dada por Aldir continua sendo a mesma escrita por ele em Agnus Sei: NÃO!

Por seres humanos como Aldir Blanc, é que tenho orgulho de ainda ter as ruas do meu coração tingidas de verde-amarelo, como a bananeira.
Salve Aldir Blanc, poeta da lucidez, da lâmina, da realidade, da parcialidade necessária à mudança, da perspicácia, do incômodo, da emoção.

Em anexo, João Bosco interpretando Agnus Sei, e, abaixo, o texto de Aldir, na íntegra:

“Quando conheci João Bosco, fiquei fascinado com um ponto comum na imensa variedade de seu repertório ainda sem letra – sambas, toadas, canções, algumas cujo gênero não era, e não é até hoje, fácil de definir: havia nelas o uivo barroco da solidão de Ouro Preto, cidade onde João estudava engenharia e compunha, em silêncio, uma revolução musical. Acho que ouvi, na casa do amigo que nos apresentou, Pedro Lourenço, mais de 30 músicas pedindo palavras, e cada uma era mais bonita e original que a outra, um paraíso para letrista em início de carreira.

Começamos a trabalhar com fitas enviadas pelo correio. Nenhum problema. Já éramos, por temperamento e destino, uma parceria indissolúvel. Tínhamos, como nos orgulhamos de ter até hoje, inesgotável vontade de trabalhar. Lembro do João, começo dos anos 70, quando já morava no Rio, pegando o violão no começo da tarde. Muitas vezes outro dia raiaria, e apesar dos uísques e cervejas, nós estávamos inteirinhos, atentos, João tocando na pontinha da cadeira, eu em frente, ligadaço, como no minuto em que havíamos começado a canção, na tarde anterior, até ficarmos satisfeitos e trocarmos um sorriso cifrado: mais uma no balaio.

João é um forte. Sofreu incompreensões e até maldades difíceis de suportar, a menos que o artista tenha um objetivo implacável. Viajamos pelo Brasil todo, João mostrando as novas no palco, eu no roteiro, na luz, às vezes na tumbadora. Detestamos avião. Pegamos turbulências incríveis, ambulâncias na pista, o escambau. Compúnhamos em táxis, butecos, aviões e de madrugada, em hotéis, quando voltávamos dos shows, incansáveis. Fizemos músicas em pé, de ressaca, na beira da calçada (o João mandou parati…), fizemos música sonhando (Escadas da Penha), fizemos música sofrendo muito. Esse é o maior orgulho da parceria: sempre ralamos com afinco, com a maior garra.

Fico imaginando a cara dos que escreveram coisas como: “eles são obcecados por uma violência que não existe”. O grifo é meu. Ótimo terem nos chamado, ainda que a intenção fosse outra, de profetas – assim como, queiram ou não, profetizamos a reabilitação de João Cândido, a Anistia, influenciados pelo passado e pelo futuro, mas sabendo que a nossa cor era e será, sempre, verde e amarela como a bananeira.

Estivemos afastados vinte minutos, vinte séculos – e esse tempo foi igual a observar as mesmas estrelas de navios diferentes, sentindo a água e o vento que nos reuniria.

Se hoje, paradoxalmente, as dificuldades são maiores, também fomos claros sobre isso: “Glória a todas as lutas inglórias!”.

E quando tentarem, mais uma vez, o aliciamento de má-fé para “facilitar”, lembraremos que, atrás dessas propostas aparentemente generosas, está a ponta dos arietes, e responderemos, como há 40 anos atrás: NÃO!”